terça-feira, 26 de julho de 2011

Uma lenda sobre a verdade nua . Por Rosana Hermann.

Era uma vez uma pequena vila onde moravam duas lindas irmãs. Todos os dias elas se arrumavam, penteavam os cabelos e elogiavam-se mutuamente por seus atributos físicos. Um dia uma delas perguntou qual era a mais bonita. Nenhuma foi capaz de dizer. Uma das irmãs resolveu então submeter essa decisão ao povo da vila. Cada uma desfilaria pela rua principal da cidade para ver a reação do povo. A que fosse mais aclamada, mais aplaudida, seria a mais bonita.


Na manhã seguinte as duas irmãs foram para a ponta da principal avenida, que atravessa o coração do vilarejo. A primeira irmã começou a caminhar lentamente, com elegância e um sorriso largo. As pessoas que passavam, sorriam de volta, acenavam e pareciam admirá-la. Quanto mais reações positivas ela conseguia, mais segurança interior ela sentia para continuar, o que provocou ainda mais acenos e sorrisos, que logo se transformaram em aplausos. Ao chegar no outro lado da avenida, pessoas em todas as casas saíam aos terraços para olhar a moça bonita e bem trajada. Ela voltou ao ponto de partida sob apupos gloriosos, sentindo-se praticamente vitoriosa na disputa pelo título de beleza.

A segunda irmã cumprimentou-a pelo sucesso e começou sua caminhada.

Já nos primeiros passos, apesar de sua altivez e segurança, a reação não foi boa. Pessoas se afastavam dela sorrateiramente. Outras se escondiam e algumas fingiam não a ver. Sem entender o que acontecia, a jovem foi tentando se expor cada vez mais, tentando chamar a atenção de todos, o que só piorava ainda mais o resultado. Moradores fechavam portas e janelas e se escondiam dela. Ao chegar do outro lado da avenida, ela estava quase fracassada.

Numa última tentativa de mostrar o quanto era bela, a moça começou a se despir de todas as roupas, caminhando total e completamente nua , para horror da população da vila, que simplesmente sumiu da praça.

A segunda irmã chegou nua e aos prantos para o ponto de partida, onde sua irmã a acolheu e cobriu-a com um manto.

- O que aconteceu comigo, minha querida irmã? Por que todos me evitam? Por acaso sou horrível ou repulsiva?

- Não, querida Verdade. Você é linda. O que acontece é que ninguém quer ver a Verdade assim, exposta diante da cara, passando na frente de todos. Muito menos assim, nua.

- Então é por isso que todos preferem você, História?

- Acho que sim, Verdade. As pessoas só conseguem compreender a verdade através de uma lenda, de uma história. A Verdade Nua é insuportável para quase todo mundo. As pessoas querem algo que dê alento, uma capa, uma veste, uma ilusão.

E assim, abraçadas, História e Verdade voltaram para sua casa enquanto o povo da vila adormeceu com suas ilusões.

Ouvi essa lenda contada por um homem, num vídeo perdido no YouTube. Reescrevi-a como me lembrei. Mas o ensinamento é sempre o mesmo. As pessoas não estão preparadas para receber a verdade, muito menos a verdade nua. Por isso, estamos sempre adereçando, adornando, vestindo e maquiando a verdade, para dar conforto a quem precisa dela saber.

Fica a reflexão inspiradora. Que figurino usamos todos os dias para vestir as verdades que não queremos despir na vida?

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