sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Muito legal esse texto da Cora Ronai sobre a historia e os cheiros!




Tenho algumas perguntas que nunca serão respondidas. Gostaria de saber, por exemplo, qual era o gosto da comida na Idade Média. Posso ler mil descrições, mas nenhuma jamais corresponderá à garfada que me esclareceria essa dúvida. Tenho certeza de que eu detestaria praticamente qualquer prato. Sutileza não era uma marca registrada da época, e usavam-se como temperos ingredientes que hoje são considerados péssimos para a saúde. Já estive em jantares “medievais” em que cozinheiros criativos tentaram recriar as antigas receitas, mas faltava-lhes metade dos ingredientes.

Toda a espécie de bicho circulava entre as pessoas, de vacas e cavalos a ratos e insetos. Ninguém tomava banho. Havia esgotos a céu aberto. Queimava-se incenso nas igrejas não por motivos sagrados, mas para dar um trato no bodum de tanta gente junta: havia quem acreditasse que o incenso evitava doenças contagiosas.Tenho também muita curiosidade em relação ao cheiro do mundo. Quando passeio por encantadoras cidades medievais da Europa, em que tudo parece cenário de filme de época, nunca me esqueço de que, na época em que foram construídas, as noções de higiene eram muito diferentes das atuais. As ruazinhas estreitas que tanto nos encantam hoje eram imundas.

Mas se o fedor do passado me interessa, mais ainda me interessa o perfume. Eu adoraria saber como cheirava Cleópatra, e quais eram os perfumes favoritos dos romanos. A resposta a essa questão está (quase) a nosso alcance: basta ir a uma perfumaria que trabalhe com óleos essenciais. Os cheiros extraídos de flores e madeiras continuam basicamente os mesmos — e assim permaneceram durante muitos séculos.


Primeira loja da Guerlain, na Rue de Rivoli, em Paris

O uso de ingredientes sintéticos é bem recente. Remonta a 1889 e foi ideia de Aimé Guerlain, filho do perfumista Pierre-François-Pascal Guerlain. O jovem Guerlain trouxe muitas novidades para a indústria, a começar por especiarias exóticas que, até aquele momento, ninguém no Ocidente considerara como matéria prima para perfumes. Nem todas, porém, funcionavam bem au naturel.

A solução? Criar “clones” daqueles cheiros maravilhosos.



Várias gerações de embalagens de Jicky

Com isso, Aimé Guerlain pode lançar Jicky, historicamente considerado o primeiro perfume moderno — o primeiro querompia com todas as tradições milenares dos cheiros bons. A adição de moléculas sintéticas ao perfumes apresentou à humanidade toda uma paleta de novas fragrâncias: o mundo nunca mais cheirou da mesma maneira.

Jicky existe até hoje e é moderno até hoje. E custa uma fábula, como convém a uma jóia atemporal.


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