O tempo é cruel com todo mundo. E não são apenas os seios e a pálpebras que amolecem. As regras da convivência a dois também sofrem com o rodar do calendário. Vão afrouxando ano a ano e atitudes que pareciam impossíveis no início da relação vão se tornando frequentes e cada vez mais acentuadas. Como já discorri longamente sobre flatos e sinfonias afins na vida a dois, fiquemos no afrouxamento das regras quanto ao uso do celular.
Primeiros meses: seus olhos brilham, beijos e agarros públicos mal te deixam perceber que o ser amado porta um aparelho de celular. E, se a única pessoa que importa está na frente, até o mais viciado esquece de carregá-lo. Além do mais, as mãos estão ocupadas demais e o mundo, por mais urgente que possa parecer, pode esperar até amanhã.
Segundo semestre: nesse período o aparelhinho começa a se fazer presente. Aparece em cima da mesa do café da manhã, do jantar... Até aquele fatídico dia em que ele (culpemos os homens por ora) precisa atender uma ligação urgente do chefe. Ele chega a ficar sem graça, levanta e se afasta, mas não sem antes te dar um beijo e pedir desculpas. “É urgente”, você pensa.
Um ano: desde a ligação do chefe as regras só se afrouxaram (e em velocidade galopante). Pouco tempo depois ele já atendia o chefe e os subordinados e nem sempre parecida urgente. Daí para começar a atender a família foi um pulo. Dado que ao completar um ano de relacionamento os telefonemas se tornaram verdadeiramente frequentes. Você pensa: “Onde estavam essas pessoas que não ligavam antes? Pelo menos ele continua se levantando...”.
Um ano e meio: como as ligações continuaram crescendo em Progressão Geométrica o mocinho parou de levantar. Na sequência, as ligações diminuíram um pouco, mas agora ele bate altos papos sentado na sua frente. E costuma dizer “Posso falar sim, diga lá”. Você fica puta, mas prefere pensar: “Gosto dele mesmo assim...”.
Dois anos depois: como diz a minha avó “onde passa boi, passa boiada” e agora você disputa a atenção do candidato a marido com milhares de jogos, aplicativos e sites que entram pelo pequeno grande monstro 3G. Você pensa: “Preciso comprar umas lingeries novas e, talvez, pintar o cabelo...”.
Três anos depois: cinta-liga, dadinho de posições exóticas, uma televisão maior, livros de arte... Você investiu seriamente na sua equipe, mas a verdade é que o pequeno monstro tem ganhado a concorrência. O TweetDeck passa a ser uma questão frequente na sua terapia. Afinal, essa concorrência parece um pouco injusta. Como você pode ser mais interessante do que milhares de seguidores, links internacionais e frases de efeito? Você pensa: “Tenho certeza de que ele sonha com uma mulher que só fale frases com 140 caracteres”. Você começa a considerar procurar um psiquiatra.
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