domingo, 10 de fevereiro de 2013

Sigo achando tudo isso um saco! O carnaval cada vez mais patrocinado! Socorro! Texto explicativo de Arthur Xexeo!




Em entrevista ao GLOBO no fim do ano passado, Rosa Magalhães, a carnavalesca que fez História na Imperatriz Leopoldinense, disse que não há mais espaço para enredos críticos no desfile de escolas de samba. Ela gostaria de fazer um, mas este não seria o momento. Um enredo crítico não seria bem aceito nem pelo público, nem pelos jurados. Com todo o respeito que Rosa merece, no alto de seus seis títulos e três vice-campeonatos, não vejo por que o público ou o júri não aceitaria o enredo crítico. Mas concordo com ela que este não é o momento para desfilar com críticas na Avenida. Afinal, isso não seria aceito pelo patrocinador. Empresários do agronegócio, por exemplo, que patrocinaram o enredo que Rosa Magalhães desenvolveu este ano para a Vila Isabel, dificilmente aceitariam pagar para ver a escola apresentar qualquer crítica a sua atividade.
Já virou lugar comum entre os carnavalescos a afirmação de que, sem patrocínio, não é mais possível fazer carnaval. Pode ser verdade. Mas é verdade também que isso vem mudando para pior o carnaval carioca. O desfile deste ano é uma prova disso. Quase todas as escolas partiram para o que é chamado de "enredo patrocinado". Como resultado, a Marquês de Sapucaí vai assistir à mais esdrúxula coleção de temas de toda a História do carnaval.



Eu aprendi o nome completo de Tiradentes antes de entrar na escola, graças ao samba-enredo "Exaltação a Tiradentes" que o Império Serrano apresentou no carnaval de 1949. (Não, eu ainda não tinha nascido, mas o samba era tão bonito que foi cantado por muitos anos, até fora do carnaval). A primeira vez em que ouvi falar em figuras obscuras de nossa História, como Chica da Silva e Dona Beija, foi nos desfiles do Salgueiro, em 1963 e 1968, respectivamente. E não consigo esquecer a emoção de ver o
autor dos primeiros livros que li sendo homenageado pela Mangueira, em 1967, com “O mundo encantado de Monteiro Lobato”. É difícil imaginar que possam passar por experiências semelhantes quem for ao carnaval deste ano e ter que assistir a apresentações sobre a Coreia do Sul (Inocentes de Belford Roxo), o Rock in Rio (Mocidade Independente), Cuiabá (Mangueira), o cavalo Mangalarga Marchador (Beija-Flor), os royalties do petróleo (Grande Rio) e o agronegócio (a já falada Vila Isabel).
É verdade que o carnavalesco sempre pode dar a volta, deixando a escola pegar o patrocínio e partindo para uma viagem que pouco tem a ver com os interesses de quem paga as contas. Rosa Magalhãe é mestre nisso. Em 2002, a Imperatriz ganhou patrocínio da prefeitura de Campos. Rosa partiu da ideia de que índios canibais habitaram a região, enveredou pelo movimento antropofágico, falou de Macunaíma e encerrou o carnaval com Chacrinha e Carmen Miranda. É claro que a prefeitura odiou. Mas o desfile foi bonito. Neste 2003, ela fez coisa parecida com o agronegócio e, no enredo "A Vila canta o celeiro do mundo — Água no feijão
que chegou mais um", ela imagina um dia na roça que culmina com uma festa no arraiá. O agronegócio está nas entrelinhas.
Mas, de um modo geral, quem quiser respeitar o interesse do patrocinador, acaba transformando o carnaval numa festa meio sem graça. E fazendo com que os artífices do desfile quebrem a cabeça para encontrar samba no enredo. Não é por acaso que, com a missão de cantar Cuiabá, os compositores Lequinho, Jr. Fionda, Igor Leal e Paulinho Carvalho, atacaram, logo no começo de seu samba-enredo para a Mangueira:“Dai-me inspiração, oh pai!”.



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