RIO - O universo das canções de Luís Capucho encontra uma boa definição nos versos iniciais de seu segundo CD, "Cinema Íris", que o compositor lança nesta sexta, às 20h, na Multifoco, na Lapa. Ele canta: "Poucos fazem como faço/ Que estou sempre na beirinha/ (...) Daqui pra lá é o fim". Seu olhar a partir dessa zona-limite resulta numa poética única na música brasileira, que aproxima crueza de submundo — de homens se masturbando vendo um striptease no cinema, mendigos — e doçura romântica.
— Quando você é romântico, não importa onde está. Pode ser num parque de diversões ou num cinema pornô — diz Capucho, que, junto com o disco, lança seu terceiro romance, "Mamãe me adora", às 18h. — Porque no parque, o que te puxa para o romantismo é a música nas caixas. Lembro de ouvir jovem guarda. E no filme pornô, é impossível não prestar atenção na música, que é romântica.
O CD passeia por lirismo denso, reflexão do cotidiano, soul quase brega, tributo indireto a Roberto & Erasmo (sua "O motorista de ônibus" é um "As curvas da estrada de Santos" num coletivo). De alguma forma, sintetiza a trajetória de Capucho. O cafona ouvido na infância e adolescência, a descoberta da homossexualidade, a MPB que é a grande referência, a participação no disco coletivo "Ovo" (que apresentava uma geração de artistas como Pedro Luís e Fred Martins) e o espancamento sofrido em 1997, que o levou a um coma.
— Minha voz e minha capacidade motora de tocar violão foram afetados — conta. — Minha escola é a MPB, que é mais sofisticada, e minhas canções, pela limitação física, acabaram ficando mais simples, baseadas em acordes maiores e e menores. Mas, por um acaso feliz, o violão rude e a voz estranha casam bem com minha temática.
‘Não gosto de poesia’
A voz estranha que, ele nota, está "mais melodiosa" do que a que aparece em "Lua singela", o CD de 2002 ("Estava mais próximo do coma"). Mas a aspereza de seu canto e de seu violão ainda é a base. Sobre ela, entram outros timbres sob o comando do produtor e tecladista Paulo Baiano e do diretor artístico Marcos Sacramento, que participa também como cantor — há ainda convidados como a cantora Suely Mesquita e a harpista Cristina Braga. Todos a serviço dos versos secos de Capucho:
— Não gosto de poesia. Quanto mais poético, mais longe da fala, mais você cria buracos. E quero ser entendido.
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