sábado, 24 de abril de 2010

Cotidiano.

Distraído, demorou quase um mês para mudar o recado da secretária eletrônica, que atendia ainda com o número antigo. Os compromissos, os shows, as horas no estúdio para acompanhar as gravações do cd ao vivo, viraram desagradáveis empecilhos que o mantinham longe da arrumação dos livros, que ele adora – uma vez ligou para o amigo Eric Nepomuceno perguntando do lado de quem ele queria ficar na estante-, da curtição de ficar no estúdio, escorregar para o terraço ou simplesmente curtir o novo lar. Quando ainda morava na casa da Gávea com a família tinha um estúdio colado na casa. “Lá era o meu canto. Agora, a casa toda aqui é o meu canto. Pela primeira vez estou curtindo coisas de casa, objetos, arrumação. Nunca me preocupei com isso antes”.

Com a desistência das esculturas, Chico comprou uma bela tela de Daniel Senise. Com orgulho, mostra a quem entra sua aquisição (“a primeira obra de arte que compro”), um quadro grande que ocupa a meia parede do lado esquerdo da porta de entrada. É um quadro sem título, que tem no centro a figura de um macaco, com estilhaços de madeira em toda a sua volta. Chico botou nome no quadro: macaco em loja de louça.
Na sala, livros de música, de arquitetura, de arte, livros sobre Vinícius, livros de fotos de Sebastião Salgado, livros sobre a obra de Oscar Niemeyer. No estúdio, além das estantes repletas de livros, fotos emolduradas na parede sobre o piano, ele com os amigos Vinícius e Tom, (...), ele com Bob Marley.
Chico cozinheiro Chico sabe fazer dois pratos que aprendeu na Itália. “Um é o pesto, só que o pesto hoje em dia ficou banalizado, todo mundo faz pesto. Quando eu fazia pesto era novidade. Era dificílimo arranjar manjericão nessa época. Eu ia para a Rocinha, as pessoas achavam que eu estava subindo para comprar cocaína, maconha. Mas lá tinha uma vendinha onde tinha majericão. Tinha que ser fresco. Eu agora tenho aqui em casa, plantado. O outro prato é uma variante do carbonara, e leva muita pimenta". Chico não é exigente para comida. Uma sopa em casa, que a empregada deixou pronta, um sanduíche.
(Chico Buarque, de Regina Zappa – trecho)

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