domingo, 13 de maio de 2012
Arte-educadora paralisada há dez anos por um derrame defende tese de doutorado; sem poder falar, Ana Barbosa, 46, se comunica com a ajuda de uma tabela de letras, que ela seleciona com movimentos do rosto, uma a uma.
Ela não fala, não come, não se move. Mas pinta, estuda e ensina arte a crianças que nasceram com paralisia cerebral. Tudo isso usando o olhar, um leve movimento de queixo e um programa de computador desenvolvido especialmente para ela.
A artista plástica Ana Amália Tavares Barbosa, 46, defende sua tese de doutorado em arte e educação no Museu de Arte Contemporânea da USP, iniciada quando já estava paralisada.
O estudo, intitulado "Além do Corpo", é fruto de três anos de trabalho com artes visuais desenvolvido com um grupo de seis crianças com lesões cerebrais, atendidas na Associação Nosso Sonho, onde Ana também leciona.
Todas as crianças usam cadeiras de rodas, não falam e têm dificuldade de enxergar. Assim como a professora.
Em 2 de julho de 2002, exatamente no dia da defesa da sua dissertação de mestrado na ECA (Escola de Comunicações e Artes), Ana Amália sofreu um AVC (Acidente Vascular Cerebral) no tronco cerebral e ficou tetraplégica, muda e disfágica (não consegue mastigar e engolir).
"Ela começou a passar mal quando uma das pessoas da banca não apareceu porque confundiu as datas. No hospital, foi perdendo os movimentos, começando pelas pernas", conta a mãe Ana Mae Barbosa, 75, professora aposentada da Faculdade de Educação da USP.
O pai, João Alexandre Costa Barbosa (morto em 2006), crítico literário e também professor aposentado da USP, acompanhava a filha.
Ele relatou à mulher as últimas palavras de Ana Amália. Ao escutar o médico perguntando se ela era muito nervosa, disparou: "Por que vocês médicos sempre acham que a culpa é do paciente?".
Como sequela, Ana Amália ficou com síndrome do encarceramento ("locked in"), retratada no filme "O Escafandro e a Borboleta" (2007).
"No primeiro ano, ela só dizia: 'eu quero morrer'. Depois, voltou a se apossar da vida", diz a mãe.
Foram 40 dias de UTI e quatro meses de internação até Ana Amália voltar para casa. A família conta com três enfermeiras, que se revezam 24 horas, duas fonoaudiólogas e duas fisioterapeutas.
Com a cognição e a memória preservadas, Ana se comunica por meio de um cartão com letras e de um programa de computador (veja quadro abaixo), desenvolvido pelas redes Sarah (Brasília) e Lucy Montoro (SP).
O atual desafio é fazer com que ela mastigue e engula a comida. Ana usa um cateter ligado ao estômago.
Ana Mae consulta a filha o tempo todo. "Quantos semestres você cursou psicologia na PUC como ouvinte? Dois, três, quatro." Ao ouvir quatro, Ana pisca os olhos. "Ela é a minha memória."
A terceira Ana da casa, Ana Lia, 11, tinha apenas um ano e oito meses quando a mãe sofreu o AVC. "Aos poucos, ela aprendeu a interpretar meus olhares", escreve, com os olhos, Ana Amália.
Os desenhos também foram (e continuam sendo) uma conexão entre as duas.
DOUTORADO
No projeto de doutorado, Ana Amália trabalhou, com a ajuda de assistentes, a percepção corporal dos alunos.
Uma das atividades foi desenhar o contorno dos corpos em papel, depois recortá-los e pintá-los. Por fim, construir cenas nas quais os corpos brincam. "Eles exploram o espaço já que não podem fazê-lo na vida real, pois estão presos à cadeira de roda."
Outra preocupação foi a inclusão cultural dos alunos. Ana Amália os levou a espaços como o Instituto Tomie Ohtake e o Jardim de Esculturas (Parque da Luz).
Pergunto qual é sua principal dificuldade. "Conviver com a invisibilidade."
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Um comentário:
que coisa mais linda, prima.
noticias assim me dão gás para viver!
obrigada por compartilhar!
beijos!!
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